O vento arrasta a cidade de terra e sopra nos ouvidos de Jennifer o hino de natal cantado na igreja vizinha. Ela choraria se fosse uma mulher de lágrimas, mas o caminho já conhecia e deslizava sorrateira pelos sentimentos como essa poeira vermelha por toda parte. Era sim uma mulher feita disso e junto com aqueles desconhecidos cantava baixinho para ninguém ouvir, relembra as lágrimas da mãe quando a fez aprender na infância para comer o pão na missa de domingo.
Em sua vida nada fica por muito, só é o tempo de passar o batom vermelho e colocar a blusa, a mini saia e de tirar da penteadeira uma máscara. Máscara? Amarra com um elástico, o cabelo já em nó. Hoje, morava numa casa grande, vários quartos e uma sala com sofá longo que se estende por todo cômodo. Arte Déco, disse um viajante enquanto era chupado no corredor.
Arte Déco, sim, mas nada sabe das paredes, prefere olhar para as árvores retorcidas sobreviventes de incêndios, ou para o céu a esperar uma tempestade que possa distraí-la por alguns minutos. A sua função ali, além de dar e receber, era a de ligar a lâmpada vermelha que na porta da casa afirmava a instituição que ali possuía. Não entendia o silêncio dos quartos todo dia 25 desse mês tão desnecessário.
Deixa as paredes para encarar o asfalto fervendo por debaixo das botas dele que a observa impetuoso, Jennifer bate os dedos na terra fofa e desenha um sol com o dedão do pé. Ele a olha com sede, com medo talvez, mantinha a distância de quem analisa uma bactéria, com curiosidade tátil de um cego. Mas ela, moça risonha, graciosa com o seu balançar de dedos e pernas, ajeita a saia de lantejoulas vermelhas e a máscara de carnaval agora pendurada no fino pescoço.
Mais um sorriso e um aceno para que perca o medo e venha de uma vez só. Ela já o espera com um copo d’água gelado. Se precisasse o sugaria para a maciez de sua vulva grossa próximo à sombra fresca de seus seios que poderia dormir por todas as noites quentes. Ele vestia uma bata vermelha e um gorro torto sustentava na cabeça, a barba alta tinha os pêlos grossos do braço forte e do restante do corpo.
- tenho sede
- já tinha visto
- tens olhos de serpente
- abusado
- obrigado pela água
- me come?
Capinava a sua vulva com a sua língua áspera enquanto ela abria o seu saco vermelho, encontrara canivete, aranhas, dinamite e maconha. Não encontrou o que buscava. Ele continuava ali tocando Beethoven entre suas pernas, ela ouvia os sinos de natal. Jennifer feroz mastigava as lantejoulas com a máscara de carnaval firme no rosto, ele explode na sua cara enquanto de prazer ela canta novamente o hino que logo mais ouvira.
Esparramada no chão com os restos dele, sonha mais uma vez entre o brilho vermelho que repousa em sua face. Ele, homem de coragem, vem lhe retirar dali, daquela poeira em seus olhos duros, ou que ao menos a mate com uma dessas armas que eles sempre carregam consigo como se temesse a própria vida. Ela não teme e não quer renascer porra nenhuma. Acorda com a noite silenciosa de natal. Como já esperava, ele se foi a deixando um recado de batom na parede arte déco de seu quarto imundo.
“Você têm os mesmos olhos de serpente da sua mãe. E a sede de seu pai”.
Papai.”
Jennifer, atônita, encontra um embrulho em papel de presente, trêmula, ao abrir encontra uma foto três por quatro de sua mãe já falecida e desenterrada agora. Relembra o que ela sempre falava, que mais dia ou menos dia o seu pai voltaria para retirar o único sentimento que ainda sobraria naquela família. E ele veio, pisando na sua máscara de carnaval, com um saco de presentes lhe dando força para apertar o gatilho.
Sorriso de borboleta e sangue de lantejoula.
Todos cantam o hino.
nhai.
ResponderExcluirkatrina, descarta o e-mail que te mandei e vê se esquece a senha hahaha, pois tb mandei sem esperança que o lesse. consegui postar!!!
é isso ae
semana que vem o tema é: escreva algo que faça o leandro não querer se matar antes dos 20. poucos dias.
bjos
Oh, Deus, o que foi isso? Muito bom...
ResponderExcluirNão nos sai da mente
ResponderExcluirAquele bonachão
sempre sorridente e solícito
Ho ho ho!
Há tempos prometeu nos uma visita,
Mas vendeu sua casa
e viajou pra não mais voltar.
A ausência embaixo da velha cama
Chora,com o sangrar da alvorada
Das más-festas tristes, desumanas!
Ceiamos então sopas azedias.
Tácito
Me orgulho de ser do mesmo blog que este cara que a cada conto nos surpreende mais.
ResponderExcluir#saudadesdaluna
Nós somos o poema drummondiano de sete faces sem uma delas tudo fica meio torto na vida.