domingo, 21 de fevereiro de 2010

Sentimentos Holográficos - ou - Os Crânios Macios

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A pessoa telefona.

-Oi, Cadafalso! Você ainda está em casa?
-Não, estou em outro lugar. Aqui é o meu holograma. Digo, o holograma do Cadafalso. Se eu fosse o meu holograma, seria um holograma de mim mesmo. E isso seria muito estranho. Pois ser um holograma já é meio estranho. Não se pode fazer muita coisa. Apenas ficar sendo um holograma, basicamente. É um tanto entediante. Mas pode falar, eu passo o recado pro Cadafalso.
-Então, holograma, como vai você?
-Muito bem! Tirando as limitações às quais já estou acostumado na minha condição de holograma.
-Imagino. Você sabe onde o Cadafalso está?
-Sim, ele saiu com seu filho. Foram comprar crânios de bebês.


Na feira.


-Quanto tá o crânio de bebê?
-R$7.
-Tudo isso?
-Se você levar 3, te faço por R$15.
-Ah, deixa, a barraca ali do outro lado vende cada crânio a R$4...
-Mas os crânios dele não são de qualidade como os meus!
-Ah, é? Qual a procedência dos seus crânios?
-São da melhor qualidade: crianças saudáveis, que tiveram boa alimentação...
-Bom, pra mim são bem parecidos com os crânios da outra barraca.
-... tiveram uma boa educação, estudaram vários idiomas...
-Entendi, posso provar um pedacinho de um deles?
-Claro! Toma.
-Hummm. Muito bom. Prova aqui filho... e aí, o que achou?
-Gostei, pai.
-Acho que esse aqui é melhor do que os últimos crânios que sua mãe comprou.
-É, mas acho que a mamãe não comprou crânios de bebês, comprou crânios de adolescentes, que são mais duros e menos saborosos.
-É, verdade, acho que estavam bem baratos e ela comprou para experimentar.
-Pois é por isso mesmo que você deve comprar aqui na minha barraca. Eu vendo crânios de bebês; a outra barraca vende crânios de pré-adolescentes. E são de procedência duvidável.
-É, pai, eu não gosto de comer crânios de crianças mais velhas, só de bebês, que são bem macios e gostosos.

Em casa.

-Chegamos!
-Oi, Cadafalso.
-Oi, holograma.
-Sua esposa ligou. Ela já vai chegar. Comprou os crânios?
-Sim, comprei.
-Ah, que ótimo. Posso ver?
-Claro. Mas por que você quer ver?
-Ué, tem algum problema isso?
-Não, é que, sendo você um holograma, não consigo entender seu interesse em comida.
-Assim você fere meus sentimentos.
-Que sentimentos? Você é um holograma.
-Você não devia falar assim comigo, vou acabar entrando em depressão outra vez.
-Que depressão??? VOCÊ É UM HOLOGRAMA!!!! Quantas vezes vou ter que repetir?
-Pai, não fala assim com ele! Olha só, você está fazendo o holograma chorar.
-Filho, você não vê? As lágrimas não são de verdade. São holográficas.
-É, realmente. Mas e os sentimentos dele?
-Também não são reais, são apenas respostas geradas pelo software do sua programação holográfica.
-Não tenham tanta certeza disso.

A esposa chega e eles jantam os crânios.

Os anos passam. Cadafalso e sua esposa geram mais um filho. A vida parece transcorrer normalmente. Até que a polícia encontra o corpo de Cadafalso enterrado num local próximo de sua casa. Os peritos dizem que o corpo está enterrado há muitos anos. Desde antes do nascimento do último filho do casal.
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6 comentários:

  1. Cadafalso se fudeu e o holograma agora é o pai de família.
    Isso é tecnologia!

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  2. tão "ESTRANHO" que dessa vez não consigo nem comentar!

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  3. Bom pra mulher que agora é só programar o que ela quer se pá! (6)

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  4. Vocês não tenham tanta certeza disso..

    ps.: Não confundiria a autoria desse texto nem com menos 40 pontos de Q.I.
    Você é muito.. vocês, ok. E eu gosto desse você.

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  5. De fato eu nunca terei um Holograma.
    Huhauhuahahuha
    Muito bom, Rafa.
    Apesar de que em um ponto eu já imaginei que o Holograma mataria o Cadafalso. ;/
    =***

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